segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

O trem do Natal, David Baldacci (dezembro/2013: livros de Natal)

Resenha de Ana Britto

David Baldacci nos oferece uma estória deliciosa, com personagens habitantes de grandes cidades, às voltas com suas vidas corridas, frustrações profissionais e desencontros amorosos. Tom Langdon, o personagem principal, é um jornalista experiente, já cobriu várias guerras e calamidades e por isso mesmo tudo o que quer agora é escrever sobre ameninidades e viver da melhor maneira que puder, embora não se sinta exatamente realizado com isso. À procura de inspiração para um livro, resolve empreender uma longa viagem de trem, de Nova York para Los Angeles, aproveitando uns dias de férias exatamente na época do Natal. A viagem revela-se extremamente interessante não só pela diversidade de pessoas a bordo do trem, mas principalmente pelas lembranças do passado e da possibilidade de reencontro com uma pessoa importante em sua vida.

O Natal no hemisfério norte pode apresentar grandes desafios em termos de natureza, tendo em vista tratar-se do inverno. E esta viagem de trem não ficará imune a isto. Haverão situações de perigo que colocarão em cheque toda a organização e relacionamentos ali estabelecidos. E é nessas situações limite que as personagens terão que se revelar cada vez mais e terão que se colocar a serviço do grupo. Ao final, surpreendentes presentes de Natal serão percebidos.

Gostei muito do livro, recomendo. É realmente um livro que reforça os sentimentos natalinos, de união, de amizade, de amor e de dar o melhor de si em tudo que se fizer.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

LOLITA, de Vladimir Nabokov (Novembro/2013: Livros que foram banidos)

Resenha de Ana Britto

Esta não foi uma leitura fácil para mim. Sou mãe de tres pessoas, sendo duas meninas e foi perturbador ler as confissões de um pedófilo cujo alvo eram meninas. Garotas por volta dos doze anos, no desabrochar da adolescência e por ele nomeadas de ninfetas, termo que se tornou popular com a publicação do livro. Porque estas meninas, embora se mostrem como as crianças que ainda são, já apresentam um início de sexualidade e sensualidade prenunciadores das futuras mulheres. 

O livro que li em outubro, sobre superação, foi o relato autobiográfico de Natasha Kampusch sobre os anos de seu sequestro, feito por um pedófilo. Natasha foi sequestrada aos dez anos de idade e só conseguiu fugir aos dezoito. Ela fala da sutil manipulação emocional que uma criança é capaz de fazer uma perceber o grande interesse de um adulto por ela. E isso, de alguma forma, bateu com o que o que Nabokov diz sobre as ninfetas, essa confusão entre sua inocência/vulnerabilidade/consciência.
Nabokov escreveu este livro como a memória/ confissão de “Humbert Humbert” (nome fictício, ele faz questão de esclarecer), atormentado pela culpa, que está preso, aguardando julgamento e que vem a falecer de morte natural antes disto acontecer. O livro conta a estória deste personagem difícil, suas taras, disfarces e estratégias.
Lolita causou muitas polêmicas, foi proibido em vários países mas hoje é um dos livros mais lidos e vendidos. Já foi filmado algumas vezes e a versão de 1997, de Adrian Lyne, com Jeremy Irons, é realmente muito boa e fiel ao livro. No posfácio, Sobre um livro intitulado “Lolita”, o autor esclarece várias circunstâncias da criação deste romance e diz que “...muitas pessoas inteligentes, sensíveis e resolutas compreenderam meu livro muito melhor do que eu poderia aqui explicá-lo”.

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

3096 dias, de Natasha Kampusch (outubro/2013: histórias de superação)

Resenha de Ana Britto
 
Natasha é uma moça austríaca, de Viena, que foi raptada por um homem vinte anos mais velho que ela quando tinha 10 anos de idade. Ela foi mantida prisioneira, no porão da casa dele, por oito anos e, aos 18 de idade, conseguiu fugir, sozinha, por sua própria conta, num momento de descuido de seu raptor. O título do livro diz exatamente a quantidade de dias em que ela foi mantida em cativeiro.
 
Várias coisas me chamaram a atenção neste livro: a consciência de Natasha de sua psiquê, de sua relação diferente com o raptor (único ser humano em sua vida durante aqueles oito anos),  de como pode crescer como pessoa e de como decidiu seu futuro, ou seja, sua fuga. Ela relata suas inseguranças infantis, a vida que tinha antes do sequestro, como teve que enfrentar seus medos e aprender rapidamente como lidar com aquele homem tão mais velho e ao mesmo tempo tão incoerente (capaz de raivas e castigos impensáveis) e, sem expor sua privacidade, nos mostrar como pode crescer e amadurecer.
 
É interessante salientar que o raptor tinha interesse em ter uma companhia/parceira inteligente e culta, embora totalmente subjugada a ele, uma escrava em suas próprias palavras. E para isso, ele providenciou livros de leitura clássicos, música e depois de alguns anos, quando já se sentia mais confiante com a submissão de Natasha, até uma estação de rádio educativa. Mas como parte da lavagem cerebral que julgava necessária para mantê-la submissa, ele fazia questão de afirmar e reafirmar a falta de amor e importância dela na família e na sociedade em geral.
 
O livro termina logo após a narração de sua fuga e ficamos com a alma lavada de pensar que finalmente aquela brava moça, que conseguiu se manter inteira naquela situação totalmente inóspita, não só em termos físicos mas também psicológicos, está livre daquele monstro e da prisão que ele criou pra ela.

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Pedro e Paula, de Helder Macedo (Set/2013 -autores portugueses contemporâneos)

Resenha de Ana Britto

Através de minha irmã caçula, apreciadora da literatura portuguesa, cheguei a Helder Macedo, crítico literário e catedrático de Camões no King’s College, em Londres, que se tornou um autor aclamado tanto pela crítica quanto pelo público com este e outros livros. Fama merecida porque, pelo que vi neste primeiro livro que li, além da estória ser instigante e interessante a maneira como ele a conta nos faz pensar não só porque traz muitas referências contemporâneas mas também porque joga luz sobre acontecimentos recentes e até ainda presentes em nossas vidas.

Pedro e Paula são irmãos gêmeos nascidos em 1945, logo após o final da Segunda Guerra Mundial, completamente diferentes um do outro não só fisicamente mas psicológica e emocionalmente. E que, mesmo sendo muito amigos desde sempre, viverão controvérias ao longo da vida que já se anunciavam naquele momento inicial. Assim como Helder Macedo, os gêmeos passaram sua infância e adolescência em Moçambique, antes da independência do país, enquanto era colônia de Portugal e se mudaram para Lisboa no início da juventude, ao ingressar na Faculdade de Medicina (Pedro) e Escola de Belas Artes (Paula). E se tornaram adultos naqueles efervescentes anos ’60, participantes das revoluções de maio de 68 em Paris, Lisboa e Londres. Toda a história política de Portugal e suas colônias, assim como a relação com o Brasil, especialmente e outros países é pano de fundo da estória de vida dos gêmeos.

O autor/narrador nos conta a estória de Pedro e Paula como um conhecido que encontramos num bar ou num café, fazendo comentários sobre o ambiente social e o comportamento das personagens, apresentando justificativas pelo relato demorado em certas situações, explicitando as conexões com os acontecimentos da época e ao final, nos atualizando sobre a situação de cada um dos personagens do livro. E tudo isso, munido de uma fina ironia que nos remete um pouco a Machado de Assis, que ele cita algumas vezes como aqui, em que diz que (ele)”encontrou aquela maneira muito especial de falar do que é no modo condicional, dizendo ao mesmo temppo o que poderia não ser e portanto poderá viar a ter sido, como Deus nos anos 60.”

domingo, 22 de setembro de 2013

Contágio Criminoso, de Patrícia Cornwell (Agosto/2013 - Vingança)

Contágio Criminoso - Patrícia Cornwell

Adriana V. F. da Silva

Este romance policial é o oitavo de uma série protagonizados pela médica-legista Kay Scarpeta. A história começa quando um cadáver é encontrado no meio do lixo, num aterro sanitário da Virgìnia(USA). Detalhes como a amputação habilidosa da cabeça e dos membros indicam que o autor do crime sabe lidar bem com ferramentas para autópsia. A narrativa tem muitos detalhes técnicos, o que deixa a leitura um pouco lenta, depois que vc se acostuma, desenvolve-se num ritmo mais intenso, ficando melhor do meio para o fim. O final para mim foi surpreendente. A Doutora Kay Scarpeta lembra muito o protagonista da série CSI.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

O Clube das Desquitadas, Olivia Goldsmith (Agosto 2013: Vingança)

Resenha de Ana Britto

O título original deste livro, em ingles, é The First Wives Club, que numa tradução mais literal poderia ser O Clube das Primeiras Esposas ou O Clube das Ex-esposas. O interessante é que esta versão brasileira é bem adequada à nossa realidade, à nossa cultura. Porque este livro é de 1992 e o divórcio no Brasil, do jeito que é nos Estados Unidos, permitindo que as pessoas se separem e se recasem quantas vezes quiserem, sem nenhuma exigência de prazos nos intervalos, só foi estabelecido de fato em 2009. Antes era necessário ou um ano de separação judicial em casos expressos na lei ou comprovada separação de fato por mais de dois anos. E este intervalo, entre a separação e o divórcio era o desquite, que seria futuramente, uma vez vencido este prazo estipulado em lei, convertido em divórcio.
A estória das amigas ricas e cinquetonas Elise, uma famosa ex-atriz, Brenda, contadora que conhece algumas estratégias contábeis não convencionais, digamos assim, e Annie, mãe afetuosa e aspirante a escritora, que após lerem a carta póstuma de Cynthia resolvem se juntar para punir o abandono dos quatro ex-maridos parece meio estereotipada mas só que não. Infelizmente numa sociedade machista e de super valorização da juventude ainda se vê por aí de montão a troca de mulheres maduras por ninfetas deslumbradas como “troféus”, como diz a autora, como sinal de sucesso e de distinção de homens maduros. Elise, Brenda e Annie se reúnem, nomeiam os pontos fracos de seus ex, fundam o clube, estabelecem seus objetivos e criam estratégias para alcança-los.
A leitura deste livro proporciona aquela sensação de vingança, de justiça feita, um pouco parecida com a satisfação obtida nos filmes de Tarantino. Só que aqui, no livro, não há sangue nem tiros, tudo é muito bem feito e exclusivamente dentro da lei. O castigo supremo é a publicação do próprio livro em questão, narrando toda a batalha e os detalhes sórdidos dessa luta.

O vermelho e o negro, Stendhal (Jul/2013 - Cor ou cores no título)

Resenha de Ana Britto

Livro curioso este, com citações clássicas antes de cada capítulo, que a mim causaram mais estranheza do que compreensão, mas que me impressionou pela crítica à hipocrisia generalizada na sociedade. A descrição das estratégias e dos raciocínios maquiavélico dos personagens fizeram com que este romance estivesse presente também na lista de romances psicológicos.
Julien Sorel sonhava em ser soldado de Napoleão, a quem idolatrava, mas acaba tornando-se padre, carreira destinada aos inteligentes e estudiosos. Ele era um rapaz bonito e extremamente pobre e soube aproveitar as oportunidades que lhe foram oferecidas, tornando-se respeitado. Suas observações sobre a vida da corte, sobre as pessoas são marcantes, assim como seu plano para conquistar a mulher desejada, quase que por puro capricho. Mas é o velho ditado de que o feitiço pode virar contra o feiticeiro que vinga. Ao conquistar a mulher desejada, que por acaso também era proibida, ele se torna refém de avassaladora paixão. E após reviravoltas mil essa paixão acabará por destruí-lo.
Embora esta estória se situe num período histórico distante (após a Revolução Francesa), as observações de seus personagens sobre os acontecimentos sociais e seus personagens é surpreendentemente atemporal. Como por exemplo este parágrafo da versão da coleção Imortais da Literatura Universal, da Nova Cultura,  tradução de Maria Cristina F. Da Silva, na página 258:
“Tal é ainda, mesmo neste século aborrecido, o império da necessidade de se divertir que, mesmo nos dias de jantares, mal o marques abandonava o salão, toda a gente desaparecia. Contanto que não se brincasse nem com Deus nem com os padres nem com o rei nem com os artistas protegidos pela corte nem com tudo que é estabelecido;  contanto que não se falasse ....... do que parecesse liberdade de opinião;  contanto que, sobretudo, não se falasse nunca de política, podia-se livremente discorrer sobre qualquer coisa.”